quinta-feira, 8 de agosto de 2013

UMA VISITA INESPERADA

O local chamava-se “O Coruja”. Fora batizado assim devido ao grande número daquela ave que à noite piava de forma agourenta e lúgubre nas árvores centenárias da chácara, um casarão colonial com sobrado e, mais ou menos, mil metros quadrados de área em terreno bastante arborizado. Como todo bom solar antigo, tinha a fama de mal-assombrado.
Quando aconteceu o fato narrado, a casa servia como república para estudantes universitários que cursavam algumas das faculdades existentes na cidade; abrigava, na época, dez alunos distribuídos em quatro quartos: um grande e dois pequenos no andar superior e um grande no andar de baixo.  Jaime, Patrick e Pedro, alunos do sexto semestre moravam no maior em cima. Renato Roberval, Severino e Cocada, alunos do terceiro e quarto semestre ocupavam os dois outros quartos do segundo andar e Jorge, Cyro e Henrique, novatos concluindo o primeiro semestre, o quarto do térreo.
Já há algum tempo os trotes pesados estavam abolidos... Mas os alunos veteranos não dispensavam algumas brincadeiras tidas como “inocentes” com objetivo de construir um congraçamento maior entre todos. Era o dia vinte de junho, quinta-feira, véspera do solstício de inverno, noite fria e considerada a mais longa do ano. Na semana seguinte entrariam em recesso até o final de julho.
Estavam todos reunidos no quarto do Jaime. Patrick que era corpulento, embora sua voz fosse absurdamente fina, falou, franzindo o cenho e fazendo uma careta, com seu timbre de falsete:
— Gente, já ia me esquecendo: amanhã, sexta feira, é o dia vinte e um de junho!
Jaime, que era o mais velho e líder já que também se constituia no morador mais antigo do Coruja, arregalou os olhos e deu um tapa na perna:
— Deus como poderia passar em branco essa data? — disse. — Já nem me lembrava! É o dia da baronesa!...
Cyro deu uma risada sem graça típica dos que estão ‘voando’ no assunto, mas que não querem dar o braço a torcer. Perguntou assim “inocentemente” como se tratasse de algo sem importância:
— É mesmo? E o que vem a ser isso?
Pedro fez cara de desaprovação, balançou a cabeça e comentou:
— Você não deveria ter tocado nesse assunto Patrick! Agora o Jorge, o Cyro e o Henrique vão querer saber do que se trata... Deveria ter esperado para falar depois da data... Na volta das férias de julho!
Os três novatos entreolharam-se. Jorge passou a língua disfarçadamente pelos lábios; não queria demonstrar curiosidade, mas estava intrigado. Finalmente indagou:
— O que significa essa data? Algum fato especial?
Renato, outro veterano, procurou desconversar:
— Ora não é nada! Bobagem do Patrick... Apenas superstições...
Jaime interferiu:
— Renato, agora que foi tocado o assunto é melhor contar logo. Eles ficarão sabendo de qualquer forma... É até pecado deixá-los assim, na ignorância de um fato tão estranho. Afinal de contas eles moram aqui!
Roberval, Severino e Cocada, os outros três alunos antigos concordaram:
— É isso mesmo — confirmou o Severino. — Ajoelhou tem que rezar! E agora Patrick: ou você conta ou nós contamos?
Patrick deu um suspiro e disse com a vozinha fina:
— Está bem, vou contar. Mas depois não reclamem... O fato é que aconteceu uma tragédia no casarão, justamente no dia vinte e um de junho...
— E daí? — perguntaram em coro os três novatos.
O Jaime pegou a deixa e prosseguiu com a fisionomia séria:
— Deixa que eu conte Patrick... Você parece uma saracura falando! A casa pertencia a um barão, figura importante do segundo império. A baronesa era muito bonita, mas não era fiel. Na noite de vinte para vinte e um de junho — justamente essa em que estamos hoje — o barão saiu para cumprir um compromisso social. Era meia-noite quando ele regressou; mais cedo do que o previsto... Quando subiu para o segundo andar escutou vozes que vinham da alcova do casal...
Jaime parou um pouco para tomar fôlego. Henrique, impaciente pediu:
— E daí? Conte logo que eu estou curioso.
— Daí — continuou Jaime — que o barão foi pé-ante-pé e espiou para dentro do quarto e viu...
— O que? — perguntaram os três novatos.
— O que seria lógico — explicou Jaime. — A baronesa estava de amores com um jovem pajem na própria cama...
Silêncio de suspense... Depois de quase um minuto Cyro perguntou:
— Desembucha logo, pombas! O que aconteceu depois?
Jaime saboreou o desfecho! A seguir concluiu com voz muito circunspecta:
— Ai o barão ficou louco! E sacando da espada decepou a cabeça da baronesa de um só golpe... e também transpassou o coração do jovem. Em seguida deu cabo de sua própria vida... Uma tragédia!
Severino concluiu:
— O grande problema é que, segundo a tradição, na noite de vinte para vinte e um de junho, à meia-noite. O fantasma da baronesa, decepado, vestido de branco e levando a própria cabeça debaixo do braço desce as escadas em busca do amor de seu amante...
— Ora, isso é conversa fiada — desabafou Henrique. Eu não acredito em fantasmas...
— Nem eu — cochichou Renato. — Mas no ano passado eu vi o tal fantasma!
Jaime ponderou:
— Está bem, existindo ou não existindo fantasmas é melhor a gente dormir porque já é tarde e, caso a baronesa apareça, se estivermos dormindo não veremos, não é mesmo? Portanto rua todo mundo... Chispa que já é hora cambada.
Todos se retiraram cada qual para seu quarto.
Cyro, Henrique e Jorge não dormiram de imediato. Ficaram durante algum tempo discutindo a possibilidade de ser verdade o relato e estavam se divertindo com a história da baronesa. Nesse instante ressoou na casa, vindo não se sabe donde, doze badaladas... Silêncio... De repente um barulho como um fraco gemido pungente. O ruído repetiu-se mais alto e foi continuando. Era algo abafado, horripilante... Os jovens entreolharam-se! Ninguém ousava emitir uma opinião. Novamente o gemido surdo terminando num lamento dramático.
Cyro, mais cético e corajoso que os colegas, resolveu investigar: entreabriu a porta do quarto e olhou para o topo da escada; uma luz de vela tremeluzente e pálida iluminava frouxamente o trecho que trazia ao térreo. No topo foi surgindo do nada uma figura toda vestida de branco! As vestes possuíam manchas vermelhas como se fossem de sangue salpicando o espaço donde saiam os ombros e, dali, pendia um dos braços, inerte, rente ao corpo... o pescoço estava perfeitamente decepado; o vulto trazia embaixo do outro braço algo redondo e também tinto de carmim, como se uma hemorragia tivesse ocorrido ali. Era uma imagem de gelar o sangue.
Quando os rapazes viram a aparição ficaram lívidos e trêmulos de terror. Não podiam subir para o quarto de cima, pois o ‘fantasma’ estava no meio da escada e soltava uivos e gemidos baixinhos, mas pavorosos, que assombravam até o mais descrente dos homens. Gritaram pelos companheiros do andar de cima, mas um silêncio total tomava conta do casarão. Não tiveram outro remédio senão correr para a rua que, naturalmente devido ao avançado da hora em uma cidade do interior, estava totalmente deserta.
No quarto de cima os outros que espiavam por uma fresta torciam-se em risos. Depois que os novatos fugiram o Severino, o paraibano baixinho que interpretara a baronesa entrou no quarto e tirou a fantasia, muito bem arranjada por sinal, perfeita com os braços postiços saindo do pescoço cortado onde existia um enchimento para dar ideia de ombros e uma bola de futebol meio murcha dentro de uma fronha imitando a cabeça decepada.
Todos rolavam de tanto rir. Por isso inicialmente o barulho macio de unhas compridas arranhando a porta do quarto devagar passou despercebido...
Entretanto logo se ouviu um gemido pavoroso, lancinante... Uma gargalhada tétrica ecoou no recinto enquanto uma voz metálica, trêmula, triste e inumana sussurrava da porta:

— Alguém me chamou?... Estou aqui!... 

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O CASARÃO DE SAMAMBAIAS

Um novo lançamento de Fergi Cavalca.


O CASARÃO DE SAMAMBAIAS
Que mistério envolve o casarão colonial da cidade de Samambaias?
O jornalista José Matias compra, da viúva de um militar a bela propriedade que pertenceu ao barão de Monte Belo, um dos “barões do café” do Vale do Paraíba.
O solar, entretanto, tem fama de agourento, azarento e mal-assombrado, pois nenhum dos proprietários que o adquiriu conseguiu prosperar ali; doenças na família, prejuízos, falências e até mortes fizeram com que seus ocupantes, durante um longo tempo, acabassem vendendo a propriedade a preços baixos ‘batendo em retirada’ com uma pressa, realmente, urgente.
José Matias, o caseiro Rozendo e sua bela neta Maurine, a negra ‘Mãe’ Sabina, o parapsicólogo Amaury e a sensitiva Beatriz formam um grupo decidido a desvendar o mistério que já perdura por cento e cinquenta anos e descobrem uma terrível tragédia envolvendo o barão e sua família.
“O Casarão de Samambaias” relata o período do apogeu do café no Vale do Paraíba, uma região foi detentora de todos os recordes nacionais de produção dessa riqueza agrícola que tanto prosperou o Brasil.
“O Casarão de Samambaias” é mais um romance de Fergi Cavalca, autor de “Arcanos da Eternidade” e “Trilhas Convergentes” cheio de aventura, história, esoterismo, misticismo e amor que prende o leitor do inicio ao fim da trama.
 Para adquirir

FERGI CAVALCA

FERGICAVALCA

Escritor: Autor dos livros “Arcanos da Eternidade”, “Trilhas Convergentes” e “O Casarão de Samambaias”,  coligidos e publicados pela Editora Baraúna Ltda – São Paulo, e ainda Os doze Degraus do Templo Sagrado  aguardando publicação e O Senhor do Abismo em fase terminal. Ensaios poéticos com a brochura “Poesias Diversas” e vários artigos, contos, crônicas e outros gêneros literários publicados no site www.fergicavalca.com.br e diversos jornais interioranos do Brasil.

Jornalista – Assessor de Imprensa da Prefeitura Municipal de Dias D’Ávila de 1986 a 1990, fundador do jornal “O IMBASSAI”, editor do boletim “AIN SOPH” durante 28 edições. Colaborador em diversos jornais da RMS.
Participação em duas antologias editadas pela Literarte, menção honrosa por participação pela Academias de Letras e Artes Buziana de Armação de Búzios, membro da ACLAV – Academia de Ciencias, Letras e Artes de Vitória – ES, indicação para o prêmio de destaque poético da ALAF – Academia de Letras e Artes de Fortaleza, Ceará, maçom e rosacruz. Convite da Prefeitura Municipal de São João Batista do Glória – MG para solenidade de lançamento do livro Trilhas Convergente naquela cidade.



Químico aposentado: Exerceu a função por mais de trinta e cinco anos em diversas empresas no Brasil e no exterior.

Magistério:
Professor de química e matemática nos seguintes colégios: Colégio Padre Torrend – Dias D’Ávila, Colégio Santa Paula – Dias D’Ávila, Colégio CEDD – Dias D’Ávila, Colégio Emanuel – Dias D’Ávila e Colégio Vinicius Viana – Dias D’Ávila.

Trabalhos avulsos:
Tradução de métodos e normas técnicas (inglês/português), Compilação e elaboração dos métodos e normas para a implantação do biodiesel.
Consultor para gerenciamento e montagem de laboratórios.
Palestras sobre autoajuda, superação e temas afins em colégios e organizações não governamentais.

VIDA COMUNITÁRIA

Cidadão diasdavilense, um dos três remanescentes pela luta em prol da emancipação política e administrativa do município de Dias D’Ávila, assessor parlamentar de dois vereadores, autor de monografia sobre a história de Dias D’Ávila, menção honrosa da Câmara Municipal por trabalhos comunitários no município.





Fernando Gimeno

sábado, 3 de agosto de 2013



Poesias diversas
Fergi Cavalca














A alma aprende
Virtudes são exemplos de fragrância,
São perfumes recolhidos na existência,
Aprendizados repletos de paciência
Ou sofridos sacrifícios desde a infância.

Mas na vida, muitas vezes a inconstância
Marca fundo o ditame da consciência;
E o saber santo da Divina Ciência
Perde-se completamente na distância.

Quem sabe até, se nas linhas do futuro
Encontro luz p’ra iluminar-me a mente
Que, teimosa, permanece no escuro...

E na ânsia de viver eternamente
Em um ambiente livre e seguro,
Aceito humilde meu fardo no presente.













Um ipê florido

Um pé de ipê floresce além, na serra,
Uma explosão, de flores amarelas...
Pétalas tão lindas, vivazes, belas...
Árvore símbolo de nossa terra.

Nesse ipê, que tinge as aquarelas
D’um quê transcendental, que a alma encerra
Na cor da primavera que descerra
A beleza que pinta suas telas...

Obrigado Senhor, que olhos deste
A este servo teu, tão pequenino,
Que absorve tua imagem celeste...

Cascata exuberante de ouro-fino,
Do amarelo singelo e agreste
Que comove meu coração menino.












Brumas

Beijar-te é apenas um gesto catatônico,
Talvez um lance escalafobético...
Já não te vejo com um sentido estético,
Quiçá prefira o teu amor platônico.

Um amor magro, feio, esquelético,
Que em surdina já se tornou afônico;
E tão veloz, tal e qual um supersônico
Afastou-se com um vigor atlético.

Se persistir será um sopro gélido
Que apesar, mesmo, deste dia tórrido
Esfriará meu coração tão cálido...

E no meu rosto cinério e pálido
Embotará minha face cênica
Magoando meu semblante cômico.














Fotossíntese do espírito

Pelas raízes as árvores profundas
Sugam seiva plena de excremento
Convertendo em líquido alimento
Essas matérias orgânicas imundas.

A profundeza do homem, complemento
De sentenças inconscientes, oriundas
Das fraquezas humanas, um pensamento
Fútil, cego e de consequências fundas.

A luz do sol transmuta a seiva bruta
Através da fotossíntese em glicose
Que no fruto se transforma em mel.

Também no homem a luz que vence a gruta
Transmuta em ouro as paixões, overdose
De boa virtude que nos eleva ao céu.
















]
Amizade

A amizade é maravilhosa...
E faz-se bela quando o amor existe
E alegra até o coração mais triste
Tornando a vida muito mais gostosa.

Seja em sonetos ou em boa prosa,
Em belas horas que ao tempo resiste,
Musiquinhas que ao coração conquiste
Ou então numa tertúlia prazerosa

Entre goles de café ou vinho tinto,
Filosofias que enchem de prazer
Até sábios de Atenas ou Corinto...

Mas nos trazem gotinhas de saber,
Felicidade que agora sinto
E sentirei, mesmo após morrer.


















A gata e o rato

Assentado no lombo do bichano,
Bem tranquilo, em delícias de soneca,
Um ratinho com a face bem moleca
Sequer sonha com um perigo insano.

Ali se instala, ano após ano...
E o felino ― uma gata bem furreca,
Sem instinto, brincando de boneca
Como se fosse simples ser humano.

A gata é comilona e com certeza
Gostaria de tê-lo à sobremesa
Como se fosse mero roedor.

Mas aí é que mora a beleza:
Pois a gata, contra a natureza
Quer apenas passar o seu amor.


















Miséria

Menino magro, tua cara esquelética
Num ricto de dor, amargo, escarnecido,
Mostra na lágrima que rola patética
Para o asfalto frio, um mundo sem sentido.

Ao teu lado a multidão caminha cética
Sem ver a tua dor de órfão esquecido.
És uma imagem fria e sem estética,
Um lixo esperando que seja removido.

Vagueias triste por esquinas e cafés
Recolhendo, na passagem, os pontapés
Que a vida te pespega a toda hora...

Ninguém vê que atrás dessa fachada
Maltrapilha, de criança abandonada,
Existe um ser que, embalde, chora!












Uma sombra
(Poema místico)

Estava posto em silencio,
Em prece, em oração...
Quando u'a mão me tocou
Nos ombros suavemente.
Vislumbrei, ou só senti
Um vulto, lembrando um véu
Tênue, diáfano, leve...
Entretanto, tinha olhos
E estes me verrumavam
No âmago de minh'alma.

Lendo meus pensamentos,
Mergulhando em meu espírito,
Espalhou pelo meu corpo
Fluidos mornos, sadios.
Não senti medo da sombra
Pois sua presença, cálida,
Mostrava que vinha apenas
Satisfazer-me a vontade,
Pois era pelos coitados
Que eu orava ao pé da cruz.

― Vem comigo ― disse o vulto,
E tomando das minhas mãos,
Juntos alçamos vôo
Em busca do infinito.
Trêmulo, receoso,
Cheio de ansiedade,
Segui o fantasma. E corria
Com a rapidez do pensamento,
Que das coisas que existem
É a mais veloz, mais sublime...

Subimos sobre a cidade,
Mas a cidade dos mortos...
Uma atroz melancolia
Carregada de tristeza,
Eivada de amarguras,
Constrangia o coração.
Escuridão e abandono
Nas avenidas estranhas,
Onde os mortos desfilavam
Ao som de roucos lamentos.

Não havia um vivente!
E todos que ali estavam,
Alguma dor carregavam
Dentro das suas almas.
Homens velhos ou mulheres,
Jovens, meninos, adultos,
De seus semblantes marcados,
De seus suspiros profundos,
A mágoa e o desespero
Brotavam espontaneamente.

Era noite e pelos becos,
Retorciam-se as sombras!
E seus gemidos pungentes
Subiam aos nossos ouvidos.
Senti um nó na garganta,
Meu coração se indagava:
― Porque este sofrimento
Tão cruel, tão doloroso,
Que brota do peito fundo
Deste seres desgraçados?

Respondeu-me o espectro
Com a voz profunda e grave:
― São eles a dor do mundo!
Em cada guerra que cresce,
Em cada crime que nasce,
Nas violências da vida,
Na crueldade do homem,
No jugo, na tirania,
Que ferem a liberdade
Como satânico algoz.

― Nos caminhos sem amor,
Do engano e da hipocrisia,
Da perfídia e traição,
Da avareza e da inveja,
Do orgulho e da vaidade,
Estes seres doloridos,
Fizeram de suas vidas
Pelo livre arbítrio da alma,
Seu inferno, sua mágoa,
Suas lágrimas, seu castigo.

― Apenas suas consciências
Os põe neste sofrimento!
O remorso ao ver perdido
O tempo de suas vidas!
Mas agora, enquanto choram,
Liberam seus sentimentos.
E se arrependem! Por isso
Nova chance, nova vida,
Será por fim concedida
Para então se redimirem.

― A Lei da Causalidade,
Tão sublime e verdadeira,
Atrela a seus destinos
O Carma que foi traçado.
Mas outra oportunidade
Renova os votos que um dia
Juraram cumprir na Terra.
É a grandeza de Deus
Manifesta na benção
Maior da reencarnação.

― Cada alma que procura
Sair destas ânsias vãs,
Vai à busca de virtudes,
De paz profunda e Amor.
Aprende na alquimia
Que purifica seu íntimo,
Que a dor também é cadinho.
Fusão de Alma e Amor
Trazem a felicidade
Da esperança e dos sonhos.

― É preciso que no íntimo
Cada ser que evolui,
Sinta a grande verdade
Que se mostra nas lições.
Deus é o maestro que rege
Com as leis da natureza,
A orquestra universal.
Mas não se esquece de nada,
Seja homem ou animal,
Vegetal ou mineral.

Nesta cidade de dores
Só ficam os arrependidos.
Os que lavaram em lágrimas
Sinceras do coração,
Os erros já cometidos.
O remorso os guiará
Para nova chance, talvez.
Aqui eles pedem perdão
E vão receber justiça
Na bênção da nova vida.

Vão ter oportunidades
De resgatar suas faltas.
Porém, muitos se perdem
No rumo de seus caminhos.
O sofrimento de agora
Breve será esquecido.
E a nova oportunidade
Transformar-se-á em dívida,
Que somada a outras dívidas
Formam o Carma do homem.

Somente pela virtude
Poderão ser ressarcidos
No tempo do vir-a-ser.
Por grande amor ao próximo,
Nas bases da Caridade,
Construirão uma aura
Mais luminosa e sadia.
Isso trará melhor sorte,
Menos débito, mais haver,
Na conta que vão prestar.

E assim falou o Anjo,
Pousando-me novamente
Na cadeira onde a prece
Eu elevara ao além.
As lágrimas escorriam
Pelo meu rosto marcado.
Não seria mais o mesmo
Pois tinha visto com a alma
A dor e a consolação
Que carregamos na vida.



Saudades de Santo Aleixo.
Serra linda! Verdinha como a esperança!
Teus riachos serpeiam pelas matas; e as águas gastam as pedras polindo-as, alisando-as com sua carícia eterna, dia após dias, ano após ano...
Ah! Que música suave é o murmúrio de tuas cascatas saltando de pedra em pedra para depois espraiar-se nas espumas que bailam nas águas tranquilas dos lagos.
Como são frescas as margens onde rochas arredondadas e cobertas de musgos emolduram uma flora rica que cresce na umidade perene à sombra da floresta. Flores rasteirinhas colorem as trilhas dos teus caminhos e, no amanhecer quando o lusco-fusco da aurora ilumina a pequena pérola de orvalho que tremeluz na pétala, uma miríade de cores explode na difração do tênue raio de sol que a atravessa. E esse raio se desmancha num espectro encantado de infinita beleza.
Ah, serra linda!
Quem me dera ter ao teu pé uma choupana! Aí eu traria um amor para me acariciar os cabelos com mão a trigueira da bela morena; uma viola afinada para cantar nas noites de lua cheia, um velho cão que lambesse meus dedos a pedir afagos... Traria também meus melhores amigos para, entre goles de um café cheiroso coado na hora e uma boa fatia de pão fresquinho com a deliciosa manteiga da roça, jogar fora uma conversa boa entremeada de momentos filosóficos e ‘causos’ que acalentam a alma.
Ah, serra linda! Teu teto são estrelas e tua luz é o luar; teu som é o trinado dos passarinhos e teu cantor é o vento! Quem me dera que quando chegasse a hora derradeira em que meu espírito fosse chamado para o além, meu corpo cansado pudesse ser enterrado sob a sombra permanente de tuas árvores para que eu pudesse usufruir de tua beleza por toda a eternidade.


Poema da Superação

Passarinho abre a gaiola
E liberta teu coração;
Bate as asas, alça o vôo
Levanta teu corpo do chão!

Veja a vida aqui de cima
E o céu tão luminoso,
Olha o lírio lá do brejo
Puro, branco e cheiroso.

Vês o rio da cascata
Descendo alegre da serra?
E da semente pequenina
Nascem gigantes da terra!

A felicidade existe
Ao teu redor passarinho!
Anda, vem, te eleva aos céus
Procura logo um caminho!

Deus já pôs no teu trinado
Belas notas d’um cantar!
Conjugação tão perfeita
Que se faz do verbo amar!

Repousa tua cabecinha
Em meu ombro, passarinho!
Encontre no meu abraço
O doce calor do ninho!

Também sofri, passarinho
E já fui jogado fora;
Embalde andei aos tropeços
Neste mundo que apavora!

Senti também outro amor
Abrindo feridas em mim;
Tive medo que a saudade
Não fosse chegar ao fim!

Sonho, e sonho bastante
Sentindo nos meus anelos
Dedos meigos e mui ternos
Afagando-me os cabelos.

Afasta a dor, passarinho,
Não quero que fiques triste!
Quero que vivas a vida:
O bem mais belo que existe.

Esqueça os redemoinhos
Que brotam na correnteza;
Mira nas águas serenas
O espelho da natureza.

Pague ódio com amor
E tristeza co’alegria;
Agradecendo a Deus
Pela luz de um novo dia.

Procura sempre a verdade
Viva a vida com paciência;
Nesse encontro com a alma
Residirá toda a ciência.

Conta comigo ao teu lado
Co’as minhas mãos estendidas.
Trago meus lábios dispostos
A beijar tuas feridas.

O bem se acerca do mal
E a rosa do espinho!
Sem medo, abra a gaiola
Do coração, passarinho.



Um novo amanhecer

Ah, homem velho, triste e cansado
Levando um fardo que te verga os ombros!
Onde vais arrastando os passos?
Porque o olhar desvairado e morto?

A vida não acaba! Recomeça
Todos os dias no brilho da manhã!
Põe de lado a dor e ergue a fronte!
Pisa de uma vez a taça amarga!

Tens a felicidade à tua volta
No riso alegre do inocente anjo
Que te aguarda na calçada ou na esquina
Esperando-te para guiar-lhe os passos.

Se tu tiveres confiança, o futuro
Será belo e promissor, ventura plena...
Trabalha para isto! Firma a marcha,
Alteia os olhos, levanta a fronte...

Há tempo para tudo! Recomeço
Nunca é tardio para a mente sã.
Arranca da tua memória, do passado,
Teus hinos nobres de louvor à vida.




Pensamentos à beira do Rio do Pico

O dia se ergue plácido
O sol me aquece tímido
O tempo torna-se tépido
E sinto Deus mais próximo.

Limpo do rosto a lágrima
Da noite que foi efêmera.
E o sonho torna-se êxtase
Trazendo-me a força máxima.

Espanto as ideias lúgubres
Sorvendo o amor tão cálido
Que acende na mente a lâmpada
Iluminando-me o cérebro.

Não sei como fui tão pérfido
Perdido em uma noite bêbada!
Pensamentos maus, ilógicos
Tornaram-me a vida trágica.

Afastei-me dos males crônicos
Que afetam o trato gástrico.
Entregar-me-ei em um cântico
Belo como um salmo bíblico.

Adeus ao instinto bélico,
Não quero a consciência gráfica
E nem extrair-me ao fórceps
Da morte, esse ser tão gélido.

Embarco na fonte cósmica
Crescendo na força iônica.
Entrego-me na matemática
Da evolução, coisa lógica.

Meu canto não é o último
Mesmo na vida prática;
E afastará sonhos mórbidos,
Mostrando-me a fé mais tônica.

Que o amor, esperança plástica,
Expulse a solidão estúpida.
Se dor, doerá no estômago.
Se flor, renovará meu íntimo.

Estou nesse rio límpido;
Já não sinto mais o látego.
Faço da alma um símbolo,
Tiro o coração do cárcere.



Cantiga da infância

Uma cantiga de versos
Sem inversos,
Pobre, chata e sem rima
Não anima.
É uma casa esburacada,
Abandonada,
Uma grotesca ruína,
Na campina.

Hoje um coração sozinho
Sem carinho,
Bombeia um sangue sem cor
Nem amor.
Como louca gargalhada
Engasgada,
Que se confunde no pranto
Do meu canto

Noto a saudade comprida,
Tão sofrida,
De um farrapo do passado,
Relembrado
Num palmo de rosto branco
Ou no banco
De uma pracinha modesta...
Numa festa...

Eu cantava ao violão,
Meu irmão,
E era noite de luar...
Um lugar,
Um suspiro, um momento,
Um lamento
Que não me sai da lembrança.
Ah, criança!

E agora a lembrança é dura,
É escura;
O futuro não é risonho,
Nem um sonho.
Tudo vira pesadelo,
Sem o anelo
Da esperança do depois
P’ra nós dois.

E carregado de tristeza
E incerteza,
Vou navegando sem rumo,
Sem aprumo.
Cansado de tantas batalhas
E das falhas
Que se espalham pelo mundo
Tão imundo.



A casinha branca do além

A casa branca na vida
Que me aguarda após a morte,
Tem trepadeira caída
Junto a avencas da sorte;
Tem alecrim perfumado
E, na frente bem fincado,
Um pinheiro alegre e forte.

É o porto seguro e franco
Que vai meu barco atracar;
O fim da viagem, o banco
Onde hei de descansar
Ao deixar meu corpo denso
Para aguardar — contra-senso
— A hora de reencarnar.



Hora da mudança

O homem sofre bastante
Com seus erros e misérias;
Ninguém quer passar a vida
Pensando nas coisas sérias.

Mas nem tudo é brincadeira
E nem tudo vem na mão;
Viver sempre resmungando
Só causa insatisfação.

Quem só repara defeito
Sem jamais ver qualidade
Vê no outro seu espelho
Sem perceber a verdade.

Vai reclamar do padeiro,
Do açougueiro, do vizinho,
Dos filhos, do companheiro
Ou das pedras do caminho.

E sempre chorar miséria
E achar que tudo é mal.
Será infeliz na vida
Não vivida, afinal.

E até mesmo a amizade
Terá os seus desencantos;
Inconformados eternos
Relegados ao seu canto.

E chorará o abandono
Por não ter mais ao seu lado
Depois de ficar sozinho
Alguém para ser culpado.



Folhas secas

Folhas que caem ao vento
Vem dançando... e dançando
Caem sem nenhum lamento.

E o vento que as vai levando,
Brisa suave e pura
Passa o tempo soprando

A folha seca, insegura,
Que mesmo morta, talvez,
Beije o vento com ternura.

E cai com uma timidez
Até o solo macio
Onde aguarda a sua vez

De ser arrastada ao rio
Pelas águas do monte
Que violam o estio;

E levam ao horizonte
A pobre folha sem cor,
Como a barca de Caronte

Carrega ao Hades da dor
A folha vinda do monte
Que o vento beijou com amor.



De novo a casinha branca

Um pensamento que sempre me vem
À mente, exato nos momentos
Que em sonho atravesso além:
É a casinha branca pequenina
Que vejo com belo avarandado
Ao olhar do alto da colina.
É bonita, mimosa, interessante...
Acho que em algum tempo do passado
Morei nela, ao menos um instante...
Pois na memória ficou gravado
Aquela casa branca deslumbrante
E verdinho, bem à frente, um gramado...
Ah, sei que quando a vida se apagar
Será na casa branca desse sonho
Que esperarei a hora de voltar.



Quem é você?

— Quem é você que alimenta
A inspiração deste verso?
E que traz todo universo
À minha mente dorida?
— Que me faz correr o sangue
Nas veias, vasos, artérias,
E dá riquezas, misérias,
Mas pela morte é vencida?

— Chamo-me vida.

— Quem é você que apavora,
Que assusta até nos sonhos
Com olhos fundos, medonhos,
E a foice que anseia o corte?
— Quem é você, tão sinistra
Que nem a vida respeita
Numa nefanda colheita
Que decide nossa sorte?

— Chamo-me morte.

— Quem é você que à morte
Já roubou desenganados?
E é sempre dos desgraçados
A última na lembrança?
— Quem é você, diga afinal,
Pois dos fracos não se esquece
E mostra ao que padece
Que quem espera alcança?

— Chamo-me esperança.

— Quem é você que a todos,
Esperança, morte, vida,
Sempre chama de querida
Trazendo ao mundo mais cor?
— Quem é você que ampara
Ou chora pela saudade,
Traz carinho, amizade,
Riso, mágoa, pranto ou dor?

— Chamo-me amor.



Noite Solar

O sol, que aquece o corpo
Nessa pedra ao pé do rio,
Ele também vê a fome,
Miséria e desvario!
E que ilumina a terra
E vê guerras sem motivo,
Assiste a dor e ódio,
Permanece compassivo,
Se escondendo no poente
Traz a noite sobre a gente.

Mas agora é de manhã
Raios brincam sobre a flor.
O sol ontem odiava
E hoje nos traz amor.
Traz cantar dos passarinhos
E esperança que cresce.
O sol que escondeu-se à noite
Agora nos traz a prece.
E a vida nos conduz
Ao sol, benção de luz.



To be, not to be or may be?

Encontros e desencontros...
Ideológicos?
Psicológicos?
Fisiológicos?
Lógicos?
Ilógicos?
Disseram-me que o mundo é uma bola:
Piramidal?
Cúbica?
Prismática?
Será uma questão de informática?
Pragmática? Sem tática?

Vivemos em um mundo com ‘puta dor’
Que pretende ser computador.
E prevemos a chegada:
Do calor do megaton,
Do horror do armagedon,
Do pavor entre nações...
Mas não há amor nos corações.

Vai dar p’ra ser feliz? Oh, sim! Dá.
Mas não sabemos como chegar lá!
Dívida externa,
Convulsão interna,
Um país moderno que ama o inferno!
Ministros sinistros,
Governadores sem pudores,
Presidentes incompetentes...
...peguei um povo na casca do ovo...

Para nosso consolo
Podemos ver a TV
E assistir em um segundo
O início e o fim do mundo!
Com o click-click na mão
Na mesma programação.
Será que não?
Que confusão!

Um gato fala inglês e um sapo ouve...
Um sábio japonês diz que confrei não é couve...
Oh, meu Deus! Que será que houve?

Entrega-se fantasma em domicílio,
A AIDS assola a humanidade,
A mulher que quiser ter filho
É o laboratório que dá a paternidade.
Será verdade?
Inconseqüência?
Indecência?
Incongruência?
Paciência! É assistir ou dormir!
E temos um BBB para curtir, e curtir, e curtir...

E no cinema? A imagem da bobagem impera!
É o reino da sacanagem! Nova era?
Quem dera que não fora!
O sexo explícito
Está implícito
No contexto do texto;
E é pretexto
Para trazer pelo cabresto
Uma horda sedenta de emoções
Que se masturba nos saguões.
São mocinhos ou vilões?
Nada! Apenas bobalhões!

O casamento é um fato
Que no ato gera um feto
E também um desafeto.
A sociedade moderna o condena...
Que pena! E os filhos?
Nem adianta tentar...
Já foi eleito falido,
Não tem jeito
Nem sentido!
Quanto tempo perdido!

Arte agora é palavrão! Como não?
Tem que haver compensação!
Se o povo gosta
De ouvir bosta
Então bosta neles pessoal!
Que tal?
Isso ainda acaba mal
E não é normal.
É uma antítese da tese
Do pragmatismo moderno,
Hodierno, do inferno...

Capitalismo,
Comunismo,
Socialismo,
Nacionalismo
E o país caindo no abismo!
Linha dura? Que loucura!
Democracia? Fantasia!
Presidencialismo? Continuísmo!
Legislativo? Inativo!
Deputado? Censurado!
Senador? Aproveitador!
Político? Paralítico; fóssil megalítico!

Que fazer grito eu, que fazer?
Talvez nada, é viver ou viver.
Ainda bem que eu posso escrever.
Vou criticar tudo um pouco,
Até ser chamado de louco.
Se eu gritar fico rouco.

Agora me vou embora:
Fique com Deus junto aos teus.
Pois é! Quem sabe?
Adeus!



Verdades que eu precisava ouvir

Verme que te arrastas pela lama,
Tens tempo, reacende a velha chama.
Onde o brado retumbante do guerreiro
Se choras a sorte o tempo inteiro?
Porque o lamento desta hora?
A vida é eterna, não acaba agora.
Joga fora coisas que consomem,
Mostra ao mundo que tu és um homem.
A vida passa! Verás que a prova
É a dor que redime e renova.
Porque a dor que agora te padece?
Nasce de novo... expande... cresce...
Na fonte infinita tens sabedoria
Que explicam nossa dor e agonia.
Trabalhar é um santo remédio,
Que revigora matando o tédio.
Pedes amor de quem te é caro?
Aplica o teu onde seja raro!
E o sol brilhará no horizonte
Trazendo a luz, dourando o monte...
Veja bem o exemplo de Jesus:
Com amor carregou a sua cruz...
Siga com ele o teu caminho
E nunca mais estarás sozinho.
Que conforto é a sede de saber!
Formar a uns... Com outros aprender...
E entenderão os que te ouvirem
Tua vivência ao que sentirem.
Confia em Deus, o supremo amor
Que cura o desencanto e a dor;
Cicatriza uma funda ferida
E dá bênçãos para uma nova vida.
Viva bem pertinho da verdade,
Cultive uma grande amizade,
E como um viajante cansado
Repouse num leito bem forrado.
Ergue a tua cabeça e segue
O porvir, mas a derrota negue.
Pois se és forte peço-te paciência
E durma em paz com a consciência.
II
Não te preocupes, não sejas fatal
E dos males queiramos o menor;
Talvez do caos que te trouxe a dor
Surja a fênix das cinzas, afinal!

Não queiras tomar tão de repente
Posturas de coração amargurado.
Pensa e veja que ao teu lado
Dependem de ti, de ti somente.

Siga no barco com a corrente
Mas não soltes o leme junto a ti.
Uma pedra cá, um recife ali,
Estorvam o rumo da vertente.

E a força que dizes possuir?
São verbos que acaso valem nada?
Faz da vida a tua namorada
E tenha esperança no porvir.

Sabes do que mais? Em teus anseios
Escuto os gemidos da paixão.
A busca dum sofrido coração
Para abrigar-se em outros seios.

E encontrar numa outra alma
Algo que te acalme pensamentos.
Ânsia fugaz, apenas linimentos,
Mas sufocam a paz e a calma.

Porém a paz não será tardia,
A calma vem após a tempestade.
Mentiras não vencem a verdade,
Passa a noite e raiará o dia.




Arco Iris

Um raio de sol nascente
Bateu na gota pequena
Que estava sobre a flor.
E a vida iridescente
Desmanchou-se serena
Num arco-íris de cor.

Passou pela minha mente
Que a natureza é um poema
Onde mais lemos o amor,
Mas o coração da gente
Vive entrando no esquema
De violência e dor.

Passa a vida de repente
E vemos que vale a pena
Orar com fé e fervor
Para que um raio nascente
Afague a gota pequena
Do coração sofredor.

E passe daí p’ra frente
A mostrar-se nessa cena
Com pouco mais de calor,
E forme uma corrente,
Fraternidade amena,
Liberdade, por favor...

Obrigado sol nascente,
Sem ti e a gota pequena
Não veria esse teor,
Mas já estou no poente
E nem sei se vale à pena
Viver ou morrer de amor.



Insônia e solidão

Como é ruim estar sozinho,
Como o tempo passa lento,
Como é comprido o caminho,
Com dói o pensamento...

Pois o corpo está cansado
E os olhos têm muito ardor
Quando eu acordo assustado
E encharcado de suor.

Faço uma prece segura
Para se feliz também.
Se o pranto uma noite dura,
De manhã o riso vem.

Quem sabe talvez um dia
Chegarei a ser feliz!
Talvez eu me torne guia
E deixe de ser aprendiz...

Enquanto não amanhece
E a noite se vai passando
O meu corpo só padece
E, sem sono, vou rolando.



Meninos, eu vi!

Feliz borboleta
Saia das matas
Levando nas patas
O pólen das flores;
Alegre casal,
Corujas noiteiras,
Depois de canseiras
Falavam de amores.

Da árvore adulta
Caía a semente
Que o vento contente
Levava em seu véu;
Da copa mais alta
Veloz passarinho
Deixava seu ninho
Em busca do céu.

Taboas do brejo
Curvavam macias
Levando bons-dias
Às águas serenas.
E dois beija-flores
Alegres, vivazes,
Beijavam lilases,
Jasmins, açucenas...

A flora e a fauna
Casavam felizes
Trazendo matizes
Ao sonho mais lindo;
Os campos, as matas,
As pedras da fonte
Uniam a fronte
Chorando e sorrindo.



Estou vivo!

Ah, vida, beleza, maravilha!
Sentado ao sol, olhando a natureza
Sinto-me Dirceu sem ter Marília,
Um rei que não tem a realeza.

E os anos deixados na loucura,
Procurando amor e carinho?
Sempre tingidos pela amargura
Na busca eterna do caminho.

Mas vou acordar e ver à frente
Dias mais felizes e risonhos.
Levantar-me querendo ser gente
E viver com ideais, tendo sonhos...

Talvez o amor adormecido
Que não passa de uma lembrança,
Mostre o tempo que não foi perdido,
Pois, no fundo, sou uma criança.

Já sei do que preciso agora
Para voltar de novo a viver.
É bom sentir que chegou a hora...
Dar a volta por cima... renascer!

Quero reviver, quero a promessa
De ter felicidade em volta!
E mudar de vida bem depressa
P’ra banir de vez essa revolta.

Quero chupar as frutas maduras
Postas no pomar da existência.
Esquecer das noites tão escuras
Cheias de medo e de carência.

E ter uns olhos bem carinhosos
E a bênção de um lar à espera.
Fazer novamente radiosos
Dias de eterna primavera.

E sentir das mãos de minha amada
Um afago gostoso no rosto;
Sentir que a vida é bela e nada
Abate um homem bem disposto.

Sentir na folha verde da plantinha,
A inspiração que me vem em verso.
Qualquer vida valerá a minha!
E a minha vale a do universo.



Escutando a razão

Já gastaste na procura,
Na agrura,
Que a vida te propiciou,
Momentos talvez felizes
Com raízes
Num tempo que já passou.

Mas deixa todas as mágoas
Pelas águas
Do rio que corre ao mar
Espera que a esperança
Já avança
Nas vozes do teu cantar.

Repara: todos os meses,
Muitas vezes,
Surgem oportunidades.
Se não tiveres atento
No momento,
Só verás passar idades.

É preciso ter coragem
Na viagem
Que damos por este mundo;
Nem na estrada do amor
Ou da dor
Voltar-se-á um segundo.

E na chegada da morte
Seja forte,
Pois a morte é passageira;
Bem pior do que morrer
É viver
Lamentando a vida inteira.




Ah, Saudade!...

Saudade que já conheço
E vive perto de mim;
Saudade, amargo começo
Do amor que chegou ao fim.
Saudade, criou raízes
E nos tornou infelizes
Pelos caminhos que andou.
Uma chama sempre acesa,
Arde com dor e tristeza
Pelo sonho que acabou.

Saudade lembrança de amor,
Começo de solidão;
Um arco-íris sem cor,
Uma esperança no chão;
Uma dor profunda e forte
Talvez pior do que a morte
Porque mata aos pouquinhos;
É dor que dói à distância,
É perfume sem fragrância,
É o amor sem seus carinhos.

É querer a todo o instante
Um alguém qu’inda se ama;
Um sobressalto constante,
Uma voz qu’inda nos chama.
Pois saudade só se sente
De alguém que deixou na gente
Um profundo querer-bem;
E apesar do sofrimento
Que sinto nesse momento
Amo a saudade também.

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